Por Marcos Rodrigues Pinto*
As
instituições de ensino vêm aplicando questionários avaliativos da
atividade docente a cada período letivo. Nestes questionários, os
alunos respondem um conjunto de perguntas as quais visam avaliar o
docente quanto a quesitos como pontualidade, assiduidade, conteúdo,
incentivo à participação do aluno, metodologia de ensino,
avaliação, relação professor-aluno, e se existe um clima de
respeito na relação professor-aluno.
Vamos
primeiramente analisar cada um desses quesitos para mostrar a
desqualificação do questionário devido a má interpretação da
pergunta, a falta com a verdade pelo que responde ao questionário, e
mesmo a idiossincrasias as quais são inescapáveis quando se conhece
o público a quem eles são aplicados.
O primeiro
problema é causado pelo conhecido analfabetismo funcional que é
fruto de uma educação de vitrine, com promoções automáticas e a
desconsideração das peculiaridades do indivíduo. O segundo
problema é muito mais particular, e vai depender do caráter do
aluno e da sua relação com o professor. O terceiro é também
particular, mas neste caso é a visão de mundo que o sujeito tem que
vai determinar a resposta que ele vai dar, tirando a objetividade da
avaliação e se perdendo nas escolhas particulares de habitantes de
mundos particulares. Em todos os casos, a avaliação tanto positiva
quanto negativa fica prejudicada.
O quesito
pontualidade é o que mostra mais distorção entre a realidade e o
resultado do questionário. Um professor que nunca faltou a uma única
aula, e que chegou pontualmente a todas elas, ganha o conceito mínimo
de alguns alunos, o médio de outros tantos e o máximo do restante
da turma. Como este quesito se refere a um fato objetivo e, no caso
de pontualidade a todos os encontros a resposta única possível
seria o conceito máximo, independente de qualquer aspecto subjetivo,
como se pode explicar que alguns alunos tenham atribuído conceitos
diferentes? Logo no primeiro quesito vê-se que o questionário não
tem valor algum e não servirá de base para qualquer estudo que se
julgue sério.
Assiduidade é a condição de quem é assíduo, isto é, que não falta com suas
obrigações, que se faz presente constantemente em um local. Pela
definição de assiduidade e pela objetividade da pergunta, novamente
temos no caso de um professor que nunca faltou a nenhuma das aulas e
as cumpriu conforme seu plano foi assíduo indubitavelmente. O fato
de haver respostas a este quesito diferentes do conceito máximo
também desqualifica todo o questionário. Podemos estar diante de
uma indisposição idiossincrática do aluno, ou simplesmente da
falta da verdade, ou mesmo da incapacidade de compreender o
significado de ser assíduo. O vocabulário limitado causado
essencialmente pelo analfabetismo funcional, mas não só por ele,
pode ser causa de desqualificação desses questionários para
quaisquer fins. Qualquer pessoa com o mínimo de desenvolvimento
cognitivo poderia usar a lógica para chegar a essa conclusão.
No quesito
conteúdo, quer-se avaliar a clareza com que o docente apresenta o
conteúdo. Ora, se o aluno não possui os requisitos mínimos para
cursar aquele grau e está ali conduzido por um sistema de promoção
automática, necessariamente ele terá uma dificuldade monstruosa
para compreender qualquer apresentação séria de um conteúdo. Um
exemplo que pode ser dado aqui é na disciplina de língua
portuguesa. Como o aluno vai poder considerar clara uma apresentação
do conteúdo sobre orações subordinadas assindéticas se ele nem
sequer sabe o que é uma oração? Temos também a via em mão
contrária: uma minoria que domina o conteúdo, independente da
capacidade expositiva do professor, responde à questão com o
quesito máximo, uma vez que para eles tudo o que foi apresentado foi
absolutamente claro. Piorando este último cenário, apenas esses
alunos responderam a essa questão. Logo, uma pergunta que deveria
ser objetiva cria possibilidades infinitas para a subjetividade e,
consequentemente, para a desqualificação do questionário.
No que se
refere ao incentivo à participação do aluno, temos um enorme
espaço para idiossincrasias diversas. Há possibilidade inclusive de
o aluno achar ruim ser incentivado a participar e, devido sua falta
de compreensão sobre a pergunta acaba por responder que o professor
teve um desempenho insatisfatório neste quesito, uma vez que o
incomodou demais solicitando a sua participação. Este exemplo,
embora pareça bastante esquisito, infelizmente é uma situação
real. Nenhum incentivo pode ser feito por imposição. De modo que o
mais frequente é deixar a oportunidade aberta e solicitar a
participação voluntária do discente. Caso os alunos que atendam a
essa solicitação sejam sempre os mesmos, procura-se incentivar
diretamente a participação dos que costumam se manter reservados.
A
metodologia de ensino também será avaliada pelo aluno, que não recebeu
instrução sobre o que é uma metodologia de ensino. Logo, esperamos
que ele imagine o que seria uma metodologia de ensino e que, dotado
da capacidade de comparação, acabe por fazer uma avaliação mais
ou menos coerente do professor. O mecanismo de comparação é
essencial no cérebro humano para que façamos as melhores escolhas
de acordo com as informações que temos a respeito das duas coisas
comparadas. O principal problema aqui é justamente sentimental. Quem
elabora o questionário idealiza uma pessoa livre de
sentimentalidades, honesto, totalmente capaz de compreender a
pergunta e optar pela resposta que mais se adeque ao seu juízo. No
entanto, a realidade é apenas um arremedo dessa idealização,
quando não a antítese. O aluno que tenha empatia pelo professor,
normalmente o elogia neste quesito, o que é igualmente errado quando
comparado ao caso do aluno que, por antipatia, dá o conceito mínimo
a um professor.
O motivo
para empatia ou antipatia, quando se trata do aluno médio pode estar
ligado ao fato de o aluno se sentir desconfortável diante de situações que
exponham a fragilidade de sua formação, envolvendo capacidade de
leitura e compreensão de texto, habilidades básicas em matemática,
conhecimentos básicos de ciências humanas e exatas.
Qualquer
um que passe 12 anos em uma escola e descubra que suas promoções
até concluir o nível médio foram simplesmente automáticas e não
por mérito tem toda a razão de se sentir traído. O problema é que
este sentimento não pode retroagir e ser derramado sobre a escola
antiga. E dificilmente este aluno vai admitir a fragilidade de sua
formação nestes 12 anos, pois a escola o faz pensar que a culpa é
exclusivamente dele, mesmo que ele tenha sido promovido ano a ano,
sem que tenha desenvolvido as habilidades necessárias para esta
promoção.
Precisamos
lembrar ainda que 30%, no mínimo, dos alunos que ocupam as vagas nas
universidades são considerados analfabetos funcionais. E isto é um
dado alarmante, mas que vem embasar de certa forma a impropriedade e
até a inutilidade dos questionários feitos aos alunos para a
avaliação docente.
Ainda temos uma pergunta sobre a avaliação efetuada pelo professor, se ela está de acordo com o conteúdo
apresentado, também não é capaz de traduzir os acontecimentos da
sala de aula de forma razoável. A maioria dos professores apresenta
um conteúdo e faz uma avaliação estritamente dentro desse
conteúdo, dificilmente o conectando a outros temas, e quando o
faz, usa de uma razoabilidade que dificilmente motivaria alguma
reclamação justa. Tanto é que se apresenta variado o percentual de
respostas quanto ao ajuste entre conteúdo e o que é
cobrado na avaliação. Por que um aluno afirma que a avaliação
está de acordo com o conteúdo e outro aluno afirma o contrário?
Qual dos dois está faltando com a verdade? Um simples exame usando o
raciocínio lógico desqualifica mais uma vez o questionário e seus
resultados.
Temos ainda a relação
professor-aluno como a mais estúpida pergunta desse tipo de
questionário. O professor atende a um público grande, variado,
cheio de especificidades. Há indivíduos extremamente melindrosos,
que por um olhar que não seja o olhar certo que ele espera naquele
momento acaba por construir um problema de relacionamento, não
somente entre ele e o professor como em relação a ele e outros
colegas. Por outro lado, professores que naturalmente sejam mais
simpáticos ganham notas mais altas, não necessariamente porque
mantenha uma relação adequada com o aluno, mas porque ganhou a
simpatia do aluno. Ter uma relação adequada com o aluno não é
abraçá-lo, cumprimentá-lo efusivamente, ou elogiá-lo
eloquentemente. A intenção, se é que o questionário teve um
planejamento pelo menos racional, está estritamente dentro do âmbito
profissional.
Outra
pergunta que provavelmente foi planejada por alguém guardando uma
enorme mágoa de seus antigos professores é se existe um clima de
respeito na relação professor-aluno. Se um professor assedia moral
ou sexualmente um aluno ou uma aluna, isto é uma conduta criminosa,
e não uma questão de simples ajuste de conduta. O que o aluno
considera desrespeitoso? O que o aluno considera respeito? A
diversidade cultural e de religião, por exemplo, dificulta o
estabelecimento de um critério universal. Por uma aluna cristã
fervorosa, um professor de biologia poderia ser considerado
desrespeitoso por afirmar que o universo surgiu de uma explosão
cósmica e que os seres humanos evoluíram de macacos. Um
questionário sério elencaria as situações que se quer mapear e
pediria ao aluno que marcasse quais daquelas condutas foram
observadas em sala. Por exemplo: o professor usou palavras de baixo
calão durante uma aula. Essa é uma conduta desrespeitosa de
âmbito universal e que não é cabível na convivência social.
Sendo
assim, a marca maior desses questionários é a vagueza de suas
ideias e o amplo espaço para idiossincrasias das mais variadas.
Prova disso é o fato de as respostas serem normalmente variadas,
distribuindo-se em percentuais de opiniões antagônicas, como se
estivéssemos diante de um programa de TV e o professor estivesse
recebendo votos de um público que se dividiu em torcida a favor e,
eventualmente, contra.
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* Doutor e mestre em Engenharia Civil (otimização evolucionária), MBA em Finanças e Private Banking, especialista em EAD. Áreas de interesse: finanças, mercado de ações, day trader, algoritmos genéticos, matemática aplicada, filosofia, economia, linguística, política, direito.