Barulho de motores e buzinas escorrendo pelas orelhas. Cores, reflexos, vultos, pessoas, árvores atravessando a retina. A rua do colégio é sempre muito movimentada na hora de entrada e de saída de alunos. É só um minutinho. Afinal, todos param em fila dupla, principalmente se forem pegar seus filhos na porta do colégio. É perigoso estacionar em local adequado e ir a pé até a porta do colégio. Pode haver um assalto, ou talvez até um sequestro, ou pior ainda: os coleguinhas do filho podem pensar que o pai dele não tem carro e isso sim seria uma tragédia. Então um minutinho parado em fila dupla não faz mal a ninguém.
O que provoca um acidente, em geral é a atitude displicente de uma ou mais pessoas em conjunto com o acaso. Mas o que fica bem claro é que muitos acidentes poderiam ser evitados se não fosse a atitude relapsa de alguém. Os acidentes não são obra do destino, são obra das pessoas. Quando uma pessoa decide andar acima do limite de velocidade estabelecido em uma via, ela assume o risco de provocar um acidente. Mas em geral ela se acha experta demais no volante e por isso seria capaz de evitar qualquer acidente. O que ela não espera é outro indivíduo, tão inconsequente como essa pessoa irá também cometer um ato de imprudência ou de imperícia. Em vias preferenciais de sentido duplo, se alguém vem em alta velocidade dará pouca chance para que o que tenta entrar nessa via o faça de forma segura. A quantidade de segundos que o indivíduo leva para conferir um lado da via e depois o outro pode ser insuficiente para entrar na via antes que entre no seu campo visual quem vem em alta velocidade. Daí quem provocou o acidente? Quem entrou da via secundária para a preferencial ou quem vinha em excesso de velocidade?
Parece comum nas cidades brasileiras em que já estive a ultrapassagem em cruzamentos e em faixas de pedestres. Esse tipo de ultrapassagem é de alto risco, porque é mínima a visibilidade para quem ultrapassa e para quem está na faixa oposta ao veículo ultrapassado. Os acidentes resultantes dessas ultrapassagens são colisões frontais, laterais ou atropelamentos.
Na cidade de Fortaleza, é bastante comum a passagem para cadeirante ser usada por motos e bicicletas. Isso tem pelo menos dois resultados indesejados: o peso das motos pode danificar a passagem que deveria ser apenas para cadeirantes; e um acidente, causado pela entrada repentina de um veículo em um ponto da via em que os projetistas consideraram que não deveria haver.
Outra atitude feita sem nenhum pudor é o uso da calçada para estacionar e até mesmo para transitar. Quando digo sem nenhum pudor, quero dizer que as pessoas que fazem isso não têm mesmo nenhum vestígio de pejo pelo que fazem. Julgam aquilo como normal. Mas há uma diferença clara entre o que é normal e o que é comum. Infringir a lei e não ter nem mesmo bom senso para agir não é normal, embora possa parecer comum no trânsito.
A verdade é que o egoísmo e o egocentrismo leva o indivíduo a acreditar que as razões e o tempo dele são os mais importantes em todo o universo de razões e de tempo das outras pessoas.
Agora voltemos aonde deixamos nosso motorista parado em fila dupla. Uma criança tenta atravessar a rua para se juntar aos amigos do outro lado. Ao desviar do sujeito parado em fila dupla e passar para a terceira faixa em uma velocidade usual para a via, um segundo motorista atropela a criança. Mas, parado em fila dupla, nosso motorista acredita que não tem nada a ver com isso. Aliás, ele pensa: "ainda bem que o meu filho eu pego bem na porta do colégio".
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